Neonazismo no Brasil

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Cai o mito do orgulho pela miscigenação racial na pátria tupiniquim

A chegada de Jean-Marie Le Pen ao segundo turno das eleições presidenciais francesas no último mês de abril não deixa dúvidas: a extrema direita xenófoba está de volta. Por toda a Europa, pipocam lideranças extremistas caracterizadas, principalmente, pelo  repúdio ao imigrante: Joerg Haider, na Áustria, Pim Fortuyn, na Holanda (assassinado no dia 6 de maio desse ano), Berlusconi, na Itália… isso sem falar na já tradicional Ku Klux Klan, nos Estados Unidos, e em outras organizações nazistas legalizadas, como a National Alliance (Aliança Nacional), por exemplo.

E o Brasil? Engana-se quem se reconforta na ilusão de que o xenofobismo é um devaneio exclusivamente do Hemisfério Norte. O estudo sobre o neonazismo no país, divulgado em 1999 pelo Ilanud (Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinqüente), mostra que, somente na cidade de São Paulo, existem mais de 30 grupos que professam ideais nazistas. Marcelo, do Orgulho Branco Paulista, nosso primeiro neonazista entrevistado, conta que “a maior parte dessas organizações nem nome tem”.

As entrevistas com os nazistas tiveram que ser feitas por e-mail e, por isso, eles serão identificados com os apelidos que usam comumente na Internet. A justificativa quem nos dá é o próprio Marcelo: “Infelizmente, não podemos ‘dar as caras’ pra você”.

O rapaz, de apenas 20 anos, conta que tem contato com organizações “White Power” (Poder Branco) desde os 15: “sempre gostei muito de filmes e documentários sobre a Segunda Guerra Mundial”, revela. “Com 13 anos, mais ou menos, comecei a pesquisar o nazismo mais a fundo, conheci o revisionismo histórico e, dois anos mais tarde, já difundia o pensamento nacional-socialista.”

Esse caminho também foi seguido, em linhas gerais, por Frindemberg, 25 anos, também um neonazista: “Sempre tive admiração pelo povo alemão, o que me levou a assistir filmes sobre a Segunda Guerra e a ler mais a respeito. Procurei ir além dos livros didáticos e descobri que o partido nacional-socialista alemão era um partido trabalhista e socialista de verdade, e pude ver quem é o verdadeiro genocida e ‘nazista de filme’ que aparecia na TV e nos livros. Percebi que negros não são bem-vindos porque são autodestrutivos e os judeus, por causa de seu caráter desprezível e mesquinho”.

Caminho diferente seguiu Adi88 (a oitava letra do nosso alfabeto é o H. Portanto, o 88 seria equivalente ao HH, um código para “Heil, Hitler”, segundo os próprios nazistas), um garoto de 17 anos. Ele conta que seu contato com idéias nazistas se deu depois de uma conversa de rua: “Sempre curti [o nazismo], mas não conhecia ninguém que fosse nazi. Então, um dia, vi um cara de botas pretas, cabeça raspada e bastante forte. Pensei que ele fosse um skinhead, mas não era. Ele não curtia coisas nazi, mas me apresentou pra um pessoal que curtia”.

A revelação de que o homem branco, de cabeça raspada e botas pretas não é um nazista nos soa estapafúrdia, pois é este o estereótipo pelo qual os identificamos.  Adi88 explica que “essa coisa de cabeça raspada perdeu espaço com o pessoal mais novo”. Frindemberg revela: “Para ser um nazista, não é preciso vestir-se com camisas com a suástica, usar coturnos ou usar a cabeça raspada, basta apenas ser e agir como tal. Eu não uso cabeça raspada ou coturno. É mais comum se vestir com roupas militares e símbolos com a cruz suástica, a cruz celta e outros códigos em encontros.”

Esses “encontros” acontecem em datas simbólicas, como o dia 20 de abril, aniversário de Adolf Hitler. Frindemberg nos explica que, para as comemorações, “não se usa a Internet, panfletos ou qualquer método de divulgação coletivo. Tudo é feito no método boca-a-boca: é mais seguro. Há brincadeiras, música e é uma boa oportunidade para saudar os novos adeptos.”

É essa clandestinidade que lhes garante a invisibilidade para burlar a lei. Isso porque, no Brasil, o nazismo é considerado crime cuja pena pode variar de um a cinco anos de prisão, nos termos da lei 7.716, de janeiro de 1989, assim como a utilização pública da suástica. Para o sociólogo Túlio Kahn, secretário executivo do Ilanud, “a existência de grupos culturais e recreativos só é ilegal na medida em que eles manifestem externamente o racismo”. De fato, é quase impossível coibir a difusão dessas idéias, pois as “reuniões” camuflam-se em casas de amigos, sítios e bares espalhados pela cidade.

Curioso notar que nossos nazistas não são necessariamente germânicos, como prevê o nazismo radical europeu, principalmente na Alemanha e na Áustria. Adi88 vem de família portuguesa, Marcelo possui ascendência francesa, italiana, espanhola e portuguesa e Frindemberg, holandesa.


A ideologia do racismo

O estudo do Ilanud mostra que o racismo nazista é direcionado a alvos bastante específicos: negros, judeus, nordestinos, imigrantes, homossexuais, comunistas, punks, petistas e anarquistas.

Convencidos da superioridade racial dos brancos, os neonazistas utilizam um sem número de adjetivos na hora de difundir os ideais de limpeza étnica no Brasil. Adi88, por exemplo, não tem meias palavras: “Somos superiores e só os escravos da nossa raça devem ficar vivos”.

Marcelo é menos direto. Ele afirma que os nazistas “não são contra todos os judeus, apenas contra os judeus sionistas”. Mas o final de sua sentença é revelador: “Como é impossível descobrir um sionista, somos forçados a ser contra todos”.

Nota-se, também, que, além do preconceito em sua forma menos dilapidada, os neonazistas são bastante conservadores. Geralmente são religiosos, contra o uso de álcool, drogas e, em algumas organizações, “o tabagismo é proibido”, como nos revela o membro do Orgulho Branco Paulista.  Outro skinhead nos conta que “alguns dos membros de nossa organização são adeptos da TFP (Tradição, Família e Propriedade), pois somos cristãos”.

Outro neonazi, identificado como Skinhead de SP, afirma, com relação aos homossexuais: “Os bichas, se tivessem vergonha na cara, honrariam a palavra homem”.

Mas são nos fóruns de discussão, espalhados pela Internet, que os nazistas despejam seus argumentos mais ácidos. No fórum do White Honour (Honra Branca), por exemplo, é comum nos depararmos com frases do tipo: “Sou contra essa baianada, essa raça que veio para São Paulo e estragou essa querida terra”; “Quando vir um preto com uma branca, castre! Essa é a nova ordem!”; ou ainda “Negros, mestiços e judeus são um vírus na nossa sociedade e nós somos a cura”.

Para o antropólogo Paulo Funari, da Unicamp, que colaborou no estudo do Ilanud, “a escolha dos nordestinos e judeus como alvos privilegiados dos ataques teriam um fundo econômico: “os nordestinos, que chegam sem qualificação, seriam vistos como usurpadores de empregos. No caso dos judeus, eles seriam o protótipo do rico, que enriquece às custas do trabalhador comum”. Túlio Kahn acredita que “a proliferação de idéias nazistas é fruto da disputa pelo mercado de trabalho”.

Essa hipótese parece justificar-se. Cião, de 20 anos, do grupo Carecas do Brasil, é enfático: “Não queremos neo-imigrantes (sic) enquanto tiver um brasileiro desempregado e passando fome nas ruas”.


O uso da violência

Segundo o Ilanud, “há suspeitas de que as manifestações racistas no país não sejam atos isolados de baderneiros, mas antes, parte de um movimento crescente e organizado”. As afirmações de nossos entrevistados parecem corroborar essa hipótese.

Marcelo conta que fazem parte de sua organização cerca de 30 pessoas e que, em casos extremos, já praticou violência em prol da causa. Cião afirma que “em geral, um Careca é violento, sim, talvez pela revolta acumulada dentro de si, por viver num ambiente violento desde criança”. Segundo ele, há mais de mil Carecas espalhados pelo Brasil. O maior grupo neonazi articulado parece ser o do Skinhead, “composto por 120 homens e 32 mulheres.

Exemplo de uso de violência por grupos neonazistas foi o que aconteceu com o homossexual Edson Neris da Silva, na Praça da República, há três anos. Ele e seu companheiro foram espancados por um grupo identificado como Carecas do ABC. Edson não resistiu aos golpes de coturno e soco inglês. Seu companheiro conseguiu escapar. Dois dos agressores (de um grupo de 18) foram condenados a 21 anos de prisão. Cião, que também é Careca, diz que não apoiou o ocorrido, “pois só sujou ainda mais a imagem perante a sociedade, e vários carecas que não tinham nada a ver com essa morte foram perseguidos, fichados e até espancados pela polícia”. Frindemberg também condena o ocorrido: “Covardia resume muito bem todo o processo. Covardia por atacarem um indivíduo indefeso”.

Aparentemente, eles não representam a opinião vigente entre os neonazis brasileiros. Recentemente, Sílvia Martins, editora do portal Mundo Negro, foi ameaçada por nazistas. Assustada, ela prefere não comentar o ocorrido: “De fato, há uma ameaça que saiu do campo virtual. Por isso, nosso advogado recomendou que não nos manifestássemos por enquanto. Não sabemos até onde vai o alcance destes nazistas”. 

Mas a violência não é apenas física. O estudo do Ilanud aponta a fabricação e fixação de cartazes, publicação e distribuição de fanzines, envio de cartas anônimas com ameaças, telefonemas que precedem os ataques e fabricação e venda de explosivos. Nesse sentido, nossos nazistas já deram sua parcela de contribuição: Adi88 conta que costuma “deixar sites desse tipo [de associações de negros e gays] fora do ar”. O skinhead revela que “há membros que preparam e distribuem pelo correio panfletos com nossos ideais a deputados e prefeitos, principalmente quando há votações importantes”.

Henry Sobel, presidente do rabinato da Congregação Israelita Paulista, conta que, há dois anos e meio, recebeu “alguns telefonemas” desses grupos. “Tive  que aumentar a segurança na Congregação, colocar seguranças nas portas todos os dias. Mas não acredito que eles sejam articulados ideologicamente”. Entretanto, o rabino sustenta que “graças a Deus, nunca recebemos cartas-bomba, apesar das ameaças isoladas”.

Beto de Jesus, presidente da Parada do Orgulho Gay, diz que costuma receber ameaças por e-mail e que as responde com bom humor ou simplesmente as ignora. “De um caso mais sério eu só me lembro de cartazes da Frente Anti-Caos, com frases do tipo: “Mate um homossexual por dia, limpe a cidade” ou “Homossexuais abusam de crianças” espalhados pelo centro da cidade. O grupo responsável foi desbaratado pela polícia. Beto é bastante incisivo ao tratar da covardia de certos grupos neonazistas: “Nunca fomos atacados durante uma parada. Eles só agem quando são maioria”.

Luiz Ramires, o Lula, presidente do Grupo Corsa (Cidadania, Orgulho, Respeito, Solidariedade e Amor) e Akiva Bronstein, presidente do Grupo GLS de Judeus Brasileiros contam que nunca foram seriamente ameaçados. Lula procura conversar com os membros do grupo no sentido de preveni-los de possíveis ataques: “Aconselho os homossexuais a andarem sempre juntos e a serem discretos”. Akiva, por sua vez, acredita que os membros de seu grupo não sofrem ameaças por dois motivos: “Primeiro porque o grupo é muito novo, foi criado em 99. Muitos nazistas nem sabem que existimos. Em segundo lugar, os judeus gays são muito discretos. É quase impossível identificar um judeu gay na rua”. Beto de Jesus completa: “Vivemos numa democracia que não respeita a diversidade”.


Diferenças ideológicas

A heterogeneidade á outra característica de nossos grupos neonazistas. Há carecas que não são nazi, skinhead que é White Power e White Power que odeia skinhead. Tem de tudo nesse universo que nos é invisível a olho nu. 

“Somos os ‘White Power’, não carecas. Carecas são imbecis, moleques de rua. São como os punks, não sabem o que fazem”. É paradoxal, mas a afirmação é de nosso entrevistado Skinhead. 

Por outro lado, Marcelo, que se identifica como um WP (White Power) é enfático ao dizer que “os carecas, na grande maioria, queriam ser WP, mas, por serem mestiços e burros, além de arruaceiros, não foram aceitos. Como eles querem ser skinheads de qualquer modo, se viram contra os WP”.

Cião, que é um Careca, explica que “os falsos skinheads são racistas, pois traíram o movimento skinhead. São mais conhecidos como White Power”. Ele afirma que não é e nem nunca foi racista, mas admite a rivalidade entre os skinheads e os WP: “essa rixa é questão de vida ou morte. Odiamos os WPs porque eles nos copiaram, falsearam nosso movimento, pregando por toda parte tudo ao contrário do que somos”.

E tem até quem esteja meio perdido no meio quebra-pau: “Estou mais pra skinhead e White Power do que pra nazista”.

Frindemberg acredita que “os neonazistas são todos irmãos”. É possível, mas nos moldes de Caim e Abel, pois, segundo Cião, “já houve muitas brigas, tiros, facadas, pauladas e mortes” entre grupos rivais.


Cibernazismo: na mira do Ministério Público

“A Internet é nossa maior arma”, afirma Adi88. “Conheço uma enorme quantidade de sites [nazistas]. Pelo menos 500 só do Brasil”.

E não é difícil encontrá-los. Basta digitarmos palavras-chave em ferramentas de busca na rede, como Google, Altavista ou Yahoo, e nos é apresentada uma enxurrada de páginas que propagam ideais nazistas. O mais impressionante é a diversificação de seus conteúdos, apesar da singularidade do tema. 

Tem nazismo para todos os (des)gostos; a internet é democrática. Há sites para quem deseja se iniciar na “arte”, com versões online de Mein Kampf. Outros, dedicam-se ao que eles consideram “revisionismo histórico”, com uma série de textos. Os mais comuns são os que pretendem “desmentir” o Holocausto, como mostra o Boletim EP.

E, como não poderia deixar de ser, há os sites que pregam a violência como forma de ação. É o caso do Orgulho Branco Paulista – Esquadrão NS (Nacional-Socialista). As idéias difundidas nessa página dispensam qualquer explicação: “Não há nenhuma dúvida de que os negros têm tendências criminosas, são todos bandidos, ladrões, assassinos, usuários e traficantes de drogas”; “Você deve ter a capacidade de libertar seu instinto animal, o demônio interior”.

É contra esse tipo de manifestação racista que o Ministério Público do Estado de São Paulo quer promover uma verdadeira caça às bruxas. No último dia 12 de junho, Luiz Antônio Guimarães Marrey, procurador de Justiça do Estado, recebeu das mãos do deputado Renato Simões, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, um dossiê relatando a existência – e o conteúdo – de, pelo menos, cinco sites neonazistas brasileiros (quatro deles hospedados nos Estados Unidos, que permitem sua existência em nome da liberdade de expressão).

Ao longo das cerca de cem páginas do documento, desfilam transcrições de trechos extraídos desses sites: “negro é fedido”, “negro não presta”, “temos que matar todos os negros”, “negros são a escória da sociedade” e outras declarações desse tipo. Contudo, o mais preocupante foi verificar que os neonazis brasileiros mantinham em suas páginas na Internet os endereços de instituições de minorias, sobretudo negros e judeus, que deveriam ser atacadas.

Num desses sites (não se sabe se faz ou não parte da denúncia de Simões), foi possível encontrar, elencados, os endereços de dez instituições. O autor foi categórico: “Aqui estão os endereços dos lugares que precisam ser atacados. Mãos à obra, companheiros!”.

Marrey se comprometeu a abrir investigações para identificar e desbaratar o grupo de extremistas por trás desses sites, mas reconhece que a batalha é árdua: “A falta de legislação específica para a internet cria lacunas perigosas. No momento, é muito difícil restringir a criação de novas páginas na rede. Logo que uma página é retirada do ar, eles criam outra. Por isso, é preciso ir atrás de quem produz o conteúdo, e não apenas tirar os sites do ar”.

Com relação aos sites nazistas hospedados fora do Brasil, o parecer do delegado Gilberto Tadeu, da Polícia Federal, não poderia ser mais desesperador: “Não há o que fazer. Não há como punirmos os responsáveis porque as leis brasileiras não valem nada fora do país.” 

Entretanto, o delegado conta que, no caso de provedores nacionais, “pode-se pedir a imediata retirada do ar da página da Internet e os responsáveis pelo seu conteúdo racista são, imediatamente, investigados”. Para Marrey, “a liberdade de expressão existe, mas esse é o limite”.

Vale lembrar que, em 1999, uma outra denúncia de Renato Simões ao Ministério Público resultou na prisão de André Schmid Amaral Gurgel, então estudante de letras da Universidade de São Paulo, acusado de incitar a violência contra negros, judeus e nordestinos. Gurgel foi condenado a prestar trabalhos comunitários a uma entidade nordestina no centro de São Paulo. 

Neste cenário desolador, só nos resta torcer para que o Ministério Público cumpra o seu papel e Marrey, sua palavra. Quanto a nós… bem, tornemo-nos constantes vigias da liberdade e da igualdade, para que os valores democráticos de nossa sociedade não sejam ofuscados pelas falsas promessas da intolerância.


Solidarité brésilienne

A chegada do ultradireitista Jean-Marie Le Pen ao segundo turno das eleições presidenciais francesas, com 17,5% dos votos, foi recebida com júbilo entre os neonazistas brasileiros. “Viu as eleições na França? Só a esquerda quer ganhar, se eles não ganham está errado. Nós não achamos isso justo em um mundo que se diz democrático. Talvez seja porque eles sabem que se nós subirmos ao poder, acabaremos com eles”, regozija-se Skinhead.

Nesse sentido, Dermeisterz, outro neonazista, prevê um cenário desanimador: “a  história está se repetindo: outra vez os judeus dominam o comércio, o desemprego cresce, outra vez nossos filhos morrem por não termos empregos, ocupados por estrangeiros. Devemos expulsar os imigrantes e nordestinos que só trazem pobreza crime e ignorância”.

 

Conflito entre árabes e judeus no Brasil pega fogo. O combustível pode ser nazista

18 de abril, manifestação pela paz no Oriente Médio em frente ao consulado americano. Abaixo da superfície de normalidade do ato pacifista, um livrinho xerocado, de apenas 15 páginas, espalhava-se entre os manifestantes. O texto, intitulado “O vergonhoso ato de terrorismo de Israel contra os palestinos – história de um massacre covarde e monstruoso”, traz uma história de massacres, estupros, pilhagem e humilhação, que teriam ocorrido na Palestina em 1948.

Marília Hess, que apóia o Gush Shalom (Bloco da Paz) e a Coalizão pela Paz em Israel, estudiosa de Hitler e o nazismo, não tem dúvidas: “membros de movimentos neonazistas estão, de alguma forma, por trás disso”. “É muita coincidência esse tipo de livro ser distribuído exatamente na antevéspera do aniversário de Hitler”, ela conta, inconformada.

Para ela, “muitas pessoas pegam carona na causa palestina para destilarem o anti-semitismo”. Marília acredita ser bastante provável que o grupo que disseminou a “obra-prima”, seja o mesmo que, 10 dias antes, exibiu faixas com frases do tipo “judeu não é raça, nunca tiveram pátria” e “Hitler, aluno dos judeus” em manifestação semelhante: “é um grupo pequeno, não sei quem são todos, mas sei que alguns fazem parte do Comitê”.

O Comitê a que ela se refere é o Comitê Brasileiro de Solidariedade ao Povo Palestino. Em uma de suas reuniões, no dia 14 de abril, um de seus membros levantou-se contra o discurso do rabino Sobel: “não haverá paz na Terra enquanto houver um judeu vivo”. Era Muhammad Nassib Mourad, presidente da Sociedade Muçulmana de São Paulo, tomando emprestada a famosa frase de Adolf Hitler.

Emir Mourad, que também é do Comitê, afirma que esta não é a posição oficial dos participantes. “Rechaçamos qualquer atitude racista e discriminatória. Nossa questão com os judeus é política, não é religiosa”. Emir não recebeu o manifesto.

Muhammad Nassib Mourad confirmou o ocorrido. “Os judeus oprimem o povo palestino. Roubam, matam e estupram. E depois vem o Sobel dizer que palestino é terrorista. Ele não sabe o que passa o povo lá. Os judeus são o câncer da humanidade”. Ele, também, diz não ter recebido o texto.

Curioso notar que, de fato, o discurso dos neonazis é parecido com o de Muhammad. Na opinião de Dermeisterz, “quanto a Ariel Sharon, não é de hoje que ele e Israel fazem o pior terrorismo, ele é o pior terrorista de todos os tempos. O que ele faz com a Palestina não tem perdão”. 

Marília pede apenas para que as pessoas lutem contra o anti-semitismo. “Sei que há radicais dos dois lados, mas a gente não pode ficar de braços cruzados enquanto uma coisa dessas acontece”.


Carolina Meyer, ativista paulista dos Amigos Brasileiros do PAZ AGORA, é jornalista.

 [ publicado na Revista Babel nº10, junho de 2002, da Universidade de São Paulo ]


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