Moacyr Scliar


RIO DE JANEIRO – Ao longo de muitos anos no ofício, raríssimas vezes comentei os livros lançados no mercado editorial. Não faz muito, abri uma exceção para Moacyr Scliar, escrevi sobre seu último romance, “Eu vos abraço, milhões”. Partindo de um verso de Schiller na “Ode à alegria”, o mesmo poema que Beethoven aproveitou para compor sua “Nona Sinfonia”, ele contou a história de uma geração atraída pelas conquistas sociais do comunismo romântico que se espalhou pelo mundo após a revolução soviética de 19l7.

A mesma geração que mais tarde se desencantou e se arrependeu de ter queimado o “Dom Casmurro” – um “romance burguês para burgueses”. Uma geração que não chegou a ser perdida, como o próprio Scliar nunca se perdeu em sua honesta e brilhante trajetória humana e intelectual.

A repercussão de sua morte, no último domingo, que continuará por muito tempo ainda, lembrou seus méritos como escritor de primeiríssimo time, dono de uma obra que engrandece o nosso tempo cultural e literário. Para os que conviveram com ele, a perda foi funda e dolorosa.

No meu caso, perdi uma referência afetiva e posso dizer que clínica. Nos últimos anos, ele foi uma espécie de âncora que tomava conta de minha saúde. Ele queria saber tudo, ver os exames que eu fazia, examinar os remédios que me receitavam. Uma amizade mais do que fraterna, quase paternal da parte dele. Embora mais moço, tomava conta de mim – e será difícil, agora, frequentar a ABL sem ele.

Viajamos pelo mundo, Paris, Barcelona, Guadalajara, Buenos Aires, praticamente por todas as capitais brasileiras, era impressionante a maneira modesta, mas eficiente que sabia usar com os diversos auditórios que o buscavam.

Valeu, Scliar, valeu muito, valeu tudo.

[ publicado na coluna Opinião da Folha de S Paulo ]

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