Em Israel, ameaçam sufocar os dissidentes

Ameaças de morte e pixações com letras vermelhas cobriram a escadaria de acesso ao apartamento de Hagit Ofran, ativista do PAZ AGORA que monitora as construções israelenses na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental.

Mesquita em chamas

Mesquita em chamas

“Hagit Ofran, z’L [descanse em paz]” – dizia uma mensagem – “Ofran, Rabin está esperando  você”, dizia outra, referindo-se a Yitzhak Rabin, primeiro-ministro de Israel assassinado em 1995 por um extremista de direita oposto aos seus esforços de paz com os palestinos. Os graffitis foram encontrados em 8 de novembro, um dia antes do 16º aniversário da morte de Rabin no calendário hebraico.

Ofran, 36, que prefere trabalhar calmamente no escritório do PAZ AGORA, foi levada involuntariamente aos holofotes. As pixações ameaçadoras que se seguiram a incidente similar na sua casa em setembro, geraram uma intensa atenção na mídia e foram vistas como emblemáticas do desafio extremista à democracia israelense, que não teria aprendido as lições do assassinato de Rabin.

Respondendo no parlamento, nesta semana, sobre as ameaças contra Ofran, o Ministro de Segurança Pública, Yitzhak Aharonovitch, reconheceu que as autoridades estavam preocupadas com a possibilidade de outro assassinato político. “A preocupação existe”, disse Aharonovitch, que pertence ao partido ultra-direitista Israel Beiteinu. “E preocupa todo o espectro político”.

Mas grande parte da violência política nos últimos meses tem vindo da extrema-direita, na forma com que colonos judeus extremistas chamam de ataques “price tag” a mesquitas palestinas, carros, plantações de oliveiras e campos na Cisjordânia, em resposta a ações limitadas de autoridades israelenses para desmantelar ou remover da região postos avançados ilegais de assentamentos.

Os atentados também se espalharam para alvos dentro de Israel. Em setembro, uma dezena de veículos foram danificados numa base militar israelense na Cisjordânia. Em outubro, foi incendiada uma mesquita de um vilarejo árabe-israelense. Um dia antes da pixação no prédio de Ofran, foi feita uma ameaça de bomba contra o escritório do PAZ AGORA em Jerusalém. Em todos esses casos, a expressão “price tag” foi pixada nos alvos.

As ameaças têm vindo à medida que deputados direitistas trabalham para apresentar legislações que objetivam restringir ou taxar pesadamente doações de governos estrangeiros a ONGs israelenses. As medidas têm claramente a intenção de sufocar organizações pacifistas e de direitos humanos, como o PAZ AGORA, que desafiam as políticas do atual governo para os territórios ocupados na guerra de 1967.

Um outro projeto de lei impõe restrições ao acesso à Suprema Corte de Justiça por grupos de direitos humanos que recorram contra eventuais violações perpetradas por autoridades.

Neste mês, a rádio pacifista israelense-palestina All for Peace [Todos pela Paz], que transmite para Israel através de transmissores instalados em Ramallah foi tirada do arsob a alegação de utilizar ilegalmente uma freqüência israelense. Mossi Raz, co-diretor israelense da estação afirmou que o motivo foi político. Danny Danon, deputado do Likud, partido do premier Benjamin Netanyahu, acusou a estação de “incitamento” e confirmou ter pressionado as autoridades a interromper suas transmissões.

Hagit Ofran discursa na Praça Rabin - 12/11/2011

Hagit Ofran discursa na Praça Rabin - 12/11/2011

Discursando numa manifestação em Tel Aviv em memória ao 16º aniversário do assassinato de Rabin, Ofran disse que as recentes iniciativas direitistas no parlamento eram parte de um esforço “para silenciar o debate público”, e que estavam inspirando violência e ameaças contra oposicionistas.

“O que algumas pessoas fazem conosco nas ruas com sprays e ameaças, o Knesset e o governo estão procurando fazer através de novas legislações”, disse.

Como diretora da Equipe de Monitoramento de Assentamentos do PAZ AGORA, Hagit coleta dados de novas obras em assentamentos e em postos avançados furtivos, que são implantados sem autorização governamental nas colinas da Cisjordânia. Dirigindo na região, documenta locais de expansão de assentamentos. Usa também fotografias aéreas e publicações oficiais pelo governo de projetos de lançamento de novos planos de construção e compila os dados, que são publicados pelo PAZ AGORA.

Trabalhando sozinha ou com um assistente, Ofran diz que o projeto de monitoramento do PAZ AGORA é o trabalho mais sistemático para acompanhar o crescimento do assentamento, o qual não é destacado em separado nos relatórios e orçamentos do governo.

Quando o Ministério de Habitação anunciou recentemente planos para novas obras em Israel, Ofran descobriu que quase metade das mais de 5.000 habitações seriam construídas em Jerusalém Oriental e em assentamentos da Cisjordânia – o maior número nos últimos anos, disse.

“Nosso foco é a opinião pública israelense. Para levantar constantemente a questão para debate, para que os jornalistas noticiem e as pessoas conversem sobre isso”. Acrescentou que, apesar de as ameaças e pixações contra ela serem perturbadora, elas não a impedem de continuar seu trabalho. A difereça é que ela presta mais atenção à sua volta.

Enquanto Ofran está preocupada com a ameaça da violência de direita, ela vê como seu principal adversário a indiferença da população frente ao empreendimento de colonização, uma atitude que diz nascer do desencanto com as perspectivas de paz com os palestinos.

Mesmo que israelenses da maior parte das tendências políticas já tenham percebido que terão que ser evacuados assentamentos como parte de um acordo de paz, existe pouca fé de que tal acordo seja possível, diz Ofran. Enquanto isto, argumenta, a expansão do assentamento vai tornando a solução de paz com dois Estados vai se tornando cada vez mais difícil.

“A maior parte do público israelense está apática sobre a questão e perdeu a esperança na paz”, diz. “Esta desesperança terrível permite que o assentamento continue. Não é que a população o apóie. O publico simplesmente não se mobiliza”.

 

[ entrevista por Joel Greenberg publicada no Washington Post em 26/11/2011 e traduzida pelo PAZ AGORA|BR ]

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