Saudades do Israel que estão matando

Venha visitar Israel. Antes que acabe.

Tenho um sobrinho que nunca viu Israel. Tenho primos, amigos e filhos de amigos que nunca estiveram aqui, mas que há muito tempo desejam conhecer o país.

Quero que venham logo. Antes que acabe.

O Israel que espero que eles vejam está morrendo a cada dia.

Família passeando na Galiléia

Família passeando na Galiléia

É o Israel que vi quando eu mesmo vim uma vez visitá-lo. Um lugar que tinha uma fé – calma, mas de tirar o fôlego – em um futuro melhor. Foi este Israel que me convenceu a ficar.

Este é o Israel que este governo e este Parlamento, decidiram, de uma vez por todas, acabar. Como êles o vêem, quanto mais rápido, mais silenciosamente e mais permanentemente, melhor.

Meu sobrinho vai ter que correr.

Eu quero que ele veja o que sobrou de um lugar de pessoas extraordinariamente calmas que sonhavam com decência e paz, que tinham por ideal fazer um lugar no mundo onde tantos nós quanto nossos vizinhos imediatos pudessem viver juntos: sem mais ódio, sem mais odiar.

Era um lugar onde havia uma crença geral de que a democracia era sagrada, os direitos da minoria deviam ser respeitados mais e mais, em vez de menos e no final nada.

Este foi o lugar para onde vim tantos anos atrás, onde havia esse clamor rude e o cheiro de bofetadas, sua linguagem direta e seus conceitos estranhos de espaço pessoal.

Estrangeiro. Era um lugar onde se acreditava que a moradia acessível, a saúde pública de qualidade, custos de vida razoáveis e emprego garantido deveriam ser disponíveis para os pobres, aos idosos e enfermos, tanto aos árabes quanto para os judeus.

Eu quero que meu sobrinho saiba que houve aqui um lugar de que seus bisavos, defensores da justiça social, anarquistas em Bialystok e depois imigrantes anarquistas na América, pudessem se orgulhar.

Quero que ele veja, antes que matem este país. Matem-no com assentamentos. Matem-no com privatizações e darwinismo social e com a mentira que chamam de livre mercado. Aos pedaços, o que é bom está sendo jogado fora, vetado, diluído em segredo ou arrancado pela força.

A cada manhã, acordamos para isso. Com medo disto. Toda manhã, uma nova abominação, uma proposta política obcena, um ultraje de um rabino, novas formas de tirar palestinos de Jerusalém ou beduínos de suas casas no Neguev, novos passos para insultar os Estados Unidos, novas formas de ameaçar a imprensa livre, novas permissões para expandir assentamentos, uma onda sem fim de atentados legislativos à democracia, de políticos vorazes.

 

Legado

Na semana passada, quando Israel marcou o aniversário do ex-primeiro-ministro Yitzhak Rabin, eu pensava sobre o lugar que isto poderia ser. O Israel, por exemplo que foi prometido pelo governo Rabin.

Um governo que lidava seriamente com as necessidades dos árabes-israelenses. Um governo que mais que duplicou o orçamento de educação para todas as crianças de Israel. Um governo que promoveu a construção de milhares de casas para jovens casais e famílias dentro de Israel, que investiu milhões em cidades periféricas abandonadas e não em novos assentamentos nos territórios, que expandiu dramaticamente os laços com o mundo muçulmano e países em desenvolvimento.

 

Yitzhak Rabin
Yitzhak Rabin

Quero que meu sobrinho conheça meus heróis, as pessoas que o fizeram apesar de guerras e tragédias e aqueles que ainda acreditam num Israel cujo futuro é de justiça social e paz.

Quero que o meu sobrinho saiba que a maioria dos israelenses acredita que os assentamentos não servem para nada além de arruinar suas vidas, manchar seu país e bloquear o caminho para a paz.

Quero que meu sobrinho veja que a gente daqui deixaram baixar sua guarda e permitiram aos que estão no poder conduzir e assuinar suas vidas.

Quero que meu sobrinho conheça os meus heróis. A gente que ainda acredita num Israel que pode subsistir. Não um grande gueto de um assentamento condenado, mas a jóia modesta de um país. Gente que espera pelo bem, gente que veja toda pessoa como merecedora de respeito, segurança e liberdade, são heróis.

E, pelo menos até agora, ainda estão aqui.

 

[ publicado em 15/11/2011 no Haaretz | traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]

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