Da “convergência” para a paz permanente

Terra Magazine tem publicado, semanalmente, duas visões sobre o conflito no Oriente Médio. Leia abaixo um artigo do ex-Ministro da Justiça israelense Yossi Beilin apresentado por Moisés Storch, coordenador dos Amigos Brasileiros do Paz Agora. O tema e a abordagem são de livre escolha dos autores.

 

Como voltar a negociações, para uma paz definitiva

Em meio à maré de pessimismo que tomou o processo de paz entre israelenses e palestinos, foi divulgado um novo documento que propõe medidas efetivas para ingressar num caminho seguro para a coexistência pacífica entre os dois sofridos povos.

Seu autor, Yossi Beilin, constata que a estratégia do governo de Israel, de incrementar retiradas unilaterais da Cisjordânia, caiu por terra após a guerra contra o Hizbolá, grupo armado que se enquistou num território libanês de onde Israel havia se retirado unilateralmente, e mostrou a vulnerabilidade de toda a região da Galiléia. Da mesma forma unilateral, a retirada de Gaza não garantiu a segurança das comunidades limítrofes.

A estratégia do unilateralismo está falida, mas tampouco existe solução armada para este conflito.

Medidas unilaterais não resolvem, porque nada substitui o diálogo e a negociação.

A nova proposta de Beilin, ex-Ministro da Justiça de Israel, é um exemplo prático de como é possível sair deste impasse, e caminhar para uma paz definitiva que atenda ao máximo o anseio dos dois povos


Novo plano de paz:

Da “convergência” para a paz permanente

  por Yossi Beilin

Uma das mais evidentes repercussões da recente guerra no Líbano foi o engavetamento não-oficial do plano que o primeiro-ministro Olmert tinha de uma significativa retirada unilateral israelense da Cisjordânia. Foi uma resposta ao sentimento, disseminado na população de Israel, de que aquela guerra lhes teria ensinado o alto preço de retiradas unilaterais.

Mas, retirar-se da Cisjordânia permanece um interesse estratégico de longo prazo de Israel. A questão para Olmert é de como transformar um plano, que foi originalmente concebido como unilateral, num que possa ser acordado com o lado palestino.

O acordo palestino para qualquer plano exigiria que este atendesse às demandas básicas palestinas, uma das principais talvez sendo a garantia de que o plano aproximasse as partes de uma solução do conflito em vez de criar novas condições para uma posterior paralisia, caso seus termos fossem apenas convenientes para Israel.

O plano a seguir, de quatro etapas é sugerido como forma de chegar a um acordo permanente de paz a partir da disposição de Olmert a se retirar de áreas significativas da Cisjordânia e da necessidade de Abu Mazen (Mahmoud Abbas) ter um horizonte político confiável.

O plano reflete a existência de um amplo apoio da população, nos dois lados, a um final do conflito israelense-palestino com base em parâmetros familiares e bem conhecidos, incluindo as idéias de Clinton, a Iniciativa Árabe de Paz, a visão Bush e a Iniciativa de Genebra. E parte do princípio de que, caso as negociações para um status final sejam concluídas com sucesso, cada lado levaria esse acordo à aprovação – e se necessário ratificação – como exigido por seu respectivo sistema político e legal.

1º Passo: Cessar-Fogo

1. Ambas as partes acordariam um cessar-fogo. Em seu contexto, Israel se retiraria da Faixa de Gaza, cessaria todas as operações de natureza letal dentro da Faixa, soltaria todos os representantes do Hamas detidos em 29 de junho assim como um certo número de prisioneiros. Os palestinos cessariam todos os ataques com foguetes contra Israel assim como todas outras formas de violência, e libertariam Gilead Shalit.

2º Passo: Retirada

2. Ambas as partes atuariam para alcançar e manter a calma, e assumiriam o compromisso de acabar com todas as formas de violência, e todas as formas de incitamento ao ódio.

3. Os palestinos dariam as boas-vindas a uma decisão estratégica de Israel de realizar uma retirada significativa da Cisjordânia até 2008. A retirada seria coordenada entre Israel, a OLP e a Autoridade Palestina. Essa coordenação cobriria aspectos de segurança, civis, econômicos e ambientais, entre outros, e quando possível, procurariam chegar a entendimentos que pudessem também vir a ser efetivos sob um acordo permanente.

4. As partes veriam a retirada como cumprimento de obrigações de Israel para com os palestinos, alinhadas com os compromissos israelenses de implementar a “Terceira Retirada Adicional” prevista no Acordo Interino de 1995 e/ou os compromissos de Israel sob a Fase 2 do Roadmap.

5. Colonos israelenses. O valor dos ativos públicos e privados deixados para trás pela retiradas seriam computados e posteriormente considerados no contexto da solução do problema dos refugiados palestinos como parte das negociações para um status permanente. 

6. Prisioneiros palestinos. Israel libertariam um número significativo de prisioneiros palestinos atualmente mantidos sob sua custódia.


3º Passo: Exercício das Opções Palestinas 

7. Após a retirada de Israel, os palestinos estenderiam seu domínio sobre os territorios evacuados sob uma das seguintes opções:

Opção A: Declarando o Estado da Palestina

i. Israel reconheceria o Estado da Palestina e sua soberania sobre toda a área que Israel não mais ocupasse.
ii. Israel reconheceria que todas as fronteiras comuns entre os dois Estados seriam provisórias e sujeitas a futuro acordo.

iii. O Estado da Palestina seria um país desmilitarizado.

 

Opção B: Ampliando o domínio da Autoridade Palestina

Se os palestinos escolherem estender seu domínio da Autoridade Palestina como estipulado sob o Acordo Interino de 1995, ambos os lados concordariam que:

iv. Todas as áreas que tivessem sido anteriormente designadas como “Área B” se transformariam em “Área A”. (Assim o tamanho total da “Área A” iria ser de 42% da Cisjordânia, somando os anteriores 18% da “A” e 24% da “B”.
v. Israel determinaria quais das áreas sob o contexto da nova retirada seriam consideradas como “Área B”; o restante seria “A”.

 

4º Passo: Negociações para um Status Permanente

8. Seriam iniciadas entre os dois lados negociações sobre um Status Permanente, paralelas à retirada de Israel e não após sua conclusão. Elas levariam ao estabelecimento do Estado da Palestina, vivendo ao lado de Israel, e seriam baseadas nos seguintes parâmetros:

a. Fronteiras / Territórios – a fronteira definitiva entre os dois lados será baseada nas linhas de 1967. Quaisquer ajustes refletindo realidades de segurança e demográficas deverão ser acordados por ambos os lados.

b. Jerusalém – As áreas judias de Jerusalém ficarão sob soberania israelense; as areas árabes sob soberania palestina. Procedimentos especiais serão encontrados para a Cidade Velha e a Bacia Sagrada de forma a garantir livre acesso e culto a todas as religiões.

c. Refugiados Palestinos – Uma solução justa e acordada seria encontrada para os refugiados palestinos, e a nenhum refugiado palestino será negada a opção de retornar para o Estado Palestino. Ambos os lados considerarão a solução acordada como o cumprimento de todas as resoluções internacionais competentes.

d. Procedimentos de Segurança – procedimentos mutuamente acordados serão componentes vitais planejados para assegurar que Israel e Palestina venham a viver lado-a-lado em paz e segurança. A Palestina será um Estado não-militarizado.

9. O Roadmap. Paralelamente à retirada de Israel e às negociações sobre um status permanente, ambas as partes iriam cumprir suas obrigações da Fase 1 do Roadmap. A comunidade internacional – representada pelo Quarteto Estados Unidos, União Européia, Rússia e ONU liderado pelos EUA ¿ monitoraria a implementação de todas as obrigações da Fase 1 e certificaria seu cumprimento.

10. Comunidade Internacional. A comunidade internacional veria a retirada de Israel como um passo importante num processo para levar à paz e estabilidade na região. Em termos imediatos, a comunidade internacional, conduzida pelo Quarteto, comprometeria recursos significativos para o sucesso da retirada, focalizando, entre outras questões, a facilitação do movimento e acesso para os palestinos na Cisjordânia, entre Cisjordânia e Gaza, e entre a Cisjordânia e a Jordânia.

Yossi Beilin, presidente do partido Meretz, foi quem iniciou as negociações secretas que levaram aos Acordos de Oslo, e o principal articulador israelense da Iniciativa de Genebra (http://www.pazagora.org/genebra), onde personalidades de ambas as sociedades civis encontraram soluções para cada uma das questões mais críticas do conflito.

Este texto foi publicado no site do Meretz e traduzido pelo PAZ AGORA|BR.para o Terra Magazine

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