Maior desafio é transformar a agressão em cooperação

Entrevista de Ariel Finguerman por Glória Paiva

Ao transpor-se as medidas do mapa para a realidade, o conflito árabe-israelense se torna ainda mais profundo e vai além da questão religiosa. Para quem assiste de perto, a luta, mais que ideológica, é por terra. Assim acredita o jornalista Ariel Finguerman, 41, que cobriu a Segunda Intifada (2000-2004) em Israel e nos territórios palestinos. Autor de “Retratos de uma Guerra – Histórias do Conflito entre Israelenses e Palestinos” (Editora Globo,…), Finguerman aposta que os dois lados do conflito estão “condenados a viver próximos um do outro”, e que seu maior desafio é transformar a agressão em cooperação. (GP)

O TEMPO – Você já mencionou a falta de espaço como um dos motivos do conflito árabe-israelense. A proximidade aumenta a intolerância?
Finguerman – A Terra Santa é um lugar pequeno, as distâncias são muito curtas. Em um dia de viagem de carro você pode atravessar toda Israel e territórios palestinos. Isto tem um forte efeito no conflito entre os dois povos. É praticamente impossível separá- los, mesmo com muralhas. No rádio, há estações em hebraico e árabe. Também as comunidades vivem umas em frente às outras. No final das contas, os dois povos terão que aprender a conviver juntos.  

Qual é a condição dos árabes com cidadania israelense, em Israel?
Existem dentro de Israel mais de 1 milhão de árabes, em uma população total de 7 milhões. Essa minoria cresce três vezes mais que a população judaica. Eles se identificam com a causa árabe e gostam de ser chamados “palestinos de cidadania israelense”. Não se identificam com o Estado judeu e sofrem discriminação, mas têm uma postura discreta. Essa situação cria desconfiança entre os judeus israelenses e, se não for bem equacionada, poderá levar a um novo conflito. Eles se rebelaram duas vezes, em 1976 e 2000, mas foram severamente reprimidos.

Qual é a situação dos judeus que vivem em assentamentos na Cisjordânia?
Esse é um grande desafio para a paz na região. Os chamados colonos judeus são cerca de 100 mil pessoas, muito apegadas àquela região. São messiânicos, acreditam que estamos no fim dos tempos e é proibido ceder aos árabes cidades sagradas como Hebron ou Nablus. Tirá-los de lá, no contexto de um acordo de paz com os palestinos, provocará um terremoto político na região.

Como o Ocidente deve interferir na questão?
Já ficou claro que os moderados israelenses e palestinos, que querem chegar a um acordo de paz, não têm força política suficiente. Nas duas sociedades há tantos radicais que a possibilidade de sabotagem da paz é enorme. Há também muita insegurança nas populações. Quando se começa a se falar em dividir Jerusalém, sentimentos religiosos de culpa enormes vêm à tona. Portanto, é essencial que as potências ocidentais pressionem israelenses e palestinos a conversarem. Sozinhos eles não conseguirão.

Quais as dificuldades enfrentadas pela imprensa na Faixa de Gaza e Cisjordânia?
É uma guerra, o jornalista corre o risco de ser baleado, espancado ou sequestrado a qualquer momento. Uma vez eu estava cobrindo um confronto em Ramallah, na Cisjordânia. Estava no meio da multidão de palestinos e corríamos quando explodia gás lacrimogênio. Como estava sempre tomando notas, um militante do Hamas cismou que eu era um espião a serviço de Israel. Ele me encarava e fez um sinal com o dedo de que iria cortar minha garganta. Não foi agradável.

Como os problemas em Gaza aprofundam as dificuldades do conflito árabe-israelense?
A chegada do Hamas ao poder em Gaza complicou bastante o quadro político. Eles não aceitam a existência de Israel e isso alimenta os radicais judeus. Mesmo os países vizinhos árabes, como o Egito e a Jordânia, que reprimem os movimentos islâmicos radicais internos, não sabem o que fazer com o Hamas. É uma incógnita o que acontecerá.

[ Publicado no Jornal OTEMPO em 24/06/2007 ]

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