Filme| Os Primeiros 54 Anos – Pequeno Manual para Ocupação Militar

Exibido no FESTIVAL INTERNACIONAL CINEBH https://cinebh.com.br/ – de 30|09 até 03|10

Documentário | Cor/ P&B | Digital | 110min | França, Finlândia, Israel, Alemanha | 2021

Classificação: Não recomendada para menores de 14 anos

Resenha: Qual é o significado da ocupação militar? Por meio de depoimentos dos soldados que o implementaram, o diretor Avi Mograbi fornece insights sobre como uma ocupação colonialista funciona e a lógica que está por trás dessas práticas. Usando a ocupação israelense de 54 anos no territórios palestinos da Cisjordânia e Faixa de Gaza, o diretor nos desenha um “Manual de Ocupação Militar”.

O filme foi exibido no Festival de Cinema de Belo Horizonte, legendado em português.

NÃO PERCA A PRÓXIMA OPORTUNIDADE!

Ficha Técnica: no final

Entrevista do diretor Avi Mograbi

[ publicada no Haaretz por Shany Littman | 04|10|2021 | traduzida por Moisés Storch para o PAZ AGORA|BR ]

O mais recente documentário do veterano cineasta israelense Avi Mograbi baseia-se nos testemunhos condenatórios de soldados para expor a Ocupação israelense. Não espere vê-lo na TV israelense ou em qualquer festival local em Israel.

O novo filme de Avi Mograbi, “Os Primeiros 54 Anos – Um Manual Abreviado para Ocupação Militar” [“The First 54 Years – An Abbreviated Manual for Military Occupation”] não tem participado das mostras em qualquer dos festivais de cinema realizados em Israel neste ano. E, até agora, nenhum canal de TV israelense se dispõs a transmiti-lo. Nem ONGs que normalmente apóiam documentários querem se envolver, ainda que Mograbi seja um cineasta veterano bem conceituado, cujos filmes anteriores tiveram muito sucesso e foram exibidos em dezenas de festivais de cinema em todo mundo.

O novo filme de Mograbi também começou a rodar em festivais internacionais de cinema e ganhou uma menção honrosa no Festival do Filme de Berlim. Mas Mograbi não se surpreendeu nem um pouco pela corrente de rejeições que o filme colheu em Israel.

‘Quando você vê o resultado, entende que a Ocupação não aconteceu à toa. Alguém em algum lugar teve que sentar e pensá-la’.

“Mesmo que [a ex-ministra da Cultura]  Miri Regev não tivesse conseguido aprovar a  Lei da Lealdade Cultural, sinto que a mensagem foi recebida”, disse, referindo-se à legislação proposta por Regev que bloquearia os fundos governamentais para instituições que “contrariam os princípios do país”.

“Claro, pode-se sempre dizer que eu sou o diretor machucado e amargurado. Mas é um continuum interessante. Ou é um filme horrível ou tem algo com que as pessoas não querem lidar. Por outro lado, é um sucesso enorme no exterior”.

From "The first 54 years"

Alguém lhe deu explicações para as rejeições em Israel?

“Não. E tampouco sou o tipo de pessoa que iria investigar. Sabia que este filme levantaria problemas”.

Uma razão, supõe, é que o filme é baseado em testemunhos de soldados, colhidos pelo Breaking the Silence, a ONG israelense anti-ocupação fundada por veteranos do exército. O grupo coleciona testemunhos de supostos abusos do exército nos territórios Ocupados e de situações embaraçosas em que os soldados se encontraram durante o serviço militar.

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“Breaking the Silence não está entre as organizações mais populares em Israel, falando delicadamente”, sorri Mograbi. “Também tenho o sentimento de que o papel que represento no filme enraivece até mesmo os esquerdistas, devido ao cinismo do meu personagem. Porque mesmo quando fazemos coisas más, não queremos pensar que estamos agindo por maldade. Mas o personagem não liga para isso. Tudo que ele deseja é cumprir suas metas, as que se atribuiu.

Mograbi faz um tipo de especialista ou palestrante que explica como realizar umaOcupação militar da forma mais eficiente. O “especialista” organiza o filme em torno do desenvolvimento cronológico da Ocupação nos territórios e em torno de vários princípios importantes que a sustentam. Entrelaçado com testemunhos de antigos soldados, as explicações maquiavélicas do especialista revelam como o processo é assustadormente metódico. O resultado é um filme deliberadamente didático. Quase um filme instrutivo. “Se você quizer fazer sua própria Ocupação, vou te ajudar a saltar algumas partes irritantes”, brinca Mograbi.

Você basicamente corta através do escuro e apresenta a Ocupação quase como uma fórmula matemática, mostrando que não existe nada de aleatório nela.

“Quando você vê o resultado, entende que ele não aconteceu por acaso. Alguém em algum lugar teve que sentar e pensar isto. Não estou dizendo que este manual exista num cofre do Ministério da Defesa, mas ele existe nas mentes de muitas pessoas que criaram esta coisa”, afirma.

“Gostammos de culpar os colonos, mas no Vale do Jordão eles começaram a construir um cinturão de assentamentos logo depois da Guerra dos Seis Dias. Essa linha marcou as fronteiras, da forma que os líderes as viam. E por todos esses anos, nos venderam que a linha formada pelos assentamentos civis ao longo do Jordão está lá para fins defensivos. Mas no Canal de Suez, quando quiseram defendê-lo, puseram lá a Linha Bar-Lev”, disse referindo-se a fortificações militares, “não um bando de civis com tratores. E, como o palestrante do filme diria, uma presença civil indica um significado em termos de propriedade da terra”.

A Ocupação tem que ser vista como parte de uma sequência de eventos envolvendo a tomada da propriedade da terra, voltando à Guerra de Imdependência de Israel em 1948, defende o diretor. “A tarefa não foi concluída em ’48 porque a terra não foi esvaziada de árabes. Na guerra de 1967, 250.000 pessoas fugiram e não lhes foi permitido retornar. A ação, todo o tempo, foi de tomar terras e tornar difícil a vida dos que ficaram ali, de forma a estimulá-los a sair. Quando visitantes vem me visitar, levo-os a Abu Dis, um lugar que era o coração de um bairro pulsante e que agora é cortado pela barreira de segurança”, disse, referindo-se a uma cidade da Cisjordânia à beira de Jerusalém.

“Para ir de um lado à continuação da mesma rua [interrompida pelo Muro], você tem que dirigir 40 minutos. Isto se não tiver que esperar em checkpoints. Imagine se você tiver que fazer um desvio por dentro de Holon para chegar à minha casa no centro de Tel Aviv desde sua casa, que fica a apenas 1 km dqui. Se tentar imaginar ter que viver assim, é difícil não ver a maldade”.

A scene from "The First 54 Years: An Abbreviated Manual for Military Occupation."

Então, quem é o sujeito mau aqui? Quem é responsável? Quem é culpado?

“Não é uma pessoa. Todos governos israelenses são responsáveis por isto. Para Israel ser um Estado judeu, tem que ter uma maioria judaica. E esta maioria não vem de graça. Então você tem que tornar essa maioria substancial e considerável. Por que os moradores dos territórios não recebem cidadania? Por que não recebem um documento israelense que lhes permita participar da vida política como cidadãos em todos os aspectos? Porque então haveria a preocupação de perdermos a maioria e que este país deixasse de ser um Estado judeu”.

Então, qual a solução, a seu ver?

“Eu não sinto que os palestinos estão me ameaçando. Não pode ser que nos seja impossível viver juntos. Acredito que a natureza humara é inerentemente boa e não inerentemente má. A idéia de que para viver ao lado do Outro você deve subordiná-lo ao seu poder não faz sentido para mim. E estou convencido de que assim como é possível a nível individual ter relações excelentes com palestinos, sem que desandem em brigas, também acho que é possível em nível nacional. Mas você tem que realmente desejá-lo, particularmente quando estamos neste tipo de buraco. Não vejo nenhuma esperança de que um dia Israel não mais queria ser um ocupante e conceda cidadania a todos palestinos ocupados. Então, poderia ser que tudo isso acabasse num insano banho de sangue. O futuro não parece promissor”.

Esquerdismo como rebelião juvenil

Mograbi, 65, nasceu em Tel Aviv. Seu pai, Gabi, era de uma família rica que veio da Síria e construiu o famoso Tel Aviv Cinema na esquina da ruas Ben-Yehuda e Allenby , mais por um sentido comercial do que por qualquer amor especial pelos filmes.

“Nos anos ‘1920, a família construía um edifício na 72 Herzl St, e meu tio Ya’akov, que supervisionava o projeto, notou um dia que os trabalhadores não estavam almoçando. Perguntou a eles o motivo, e eles contaram que estavam poupando para ir ao cinema. Se os trabalhadores estavam abrindo mão de comer para ir ao cinema, esse deve ser um bom negócio, disse. Aí eles compraram aquele terreno e construíram o cinema”.

Mograbi diz que o seu pai não era um devoto por filmes, mas sem intenção, deu ao filho uma educaçao cinematográfica muito ampla.

Avi Mograbi. 'All the interviewees were people whose military service caused them to undergo some kind of transformation.'

‘A coisa mais impressionante é que todos rejeitam, de cara, a possibilidade de que exista um plano, de que existe um processo grande por trás desta coisa [a Ocupação]’.

“Ele tinha uma qualidade muito importante para um dono de cinema. Ele sabia qual filme daria certo. Nós tínhamos um relacionamento interessante. Ele assistia a filmes de 35mm numa pequena sala de projeção na Achad Ha’am St – cópias ainda não submetidas à censura, e eu assistia com ele. Eu via coisas que não seriam muito apropriadas para uma criança”, lembrou Mograbi. “Desde jovem trabalhei no cinema. Mas também havia muita tensão entre nós”.

Seu pai, disse, era muito contrário aos seus projetos de estudar cinematografia. “Quando eu tinha 18, eu trabalhava na bilheteria e o filme que estava passando era o ‘Big Eyes’ de Uri Zohar, que sentou atrás de mim e contava os ingressos vendidos em uma mão. Meu pai entrou na bilheteria e me disse, na frente dele – “É isto que você quer ser”?

Em vez de cinema, Mograbi estudou filosofia na Universidade de Tel Aviv e Artes na Hamidrashá Art School, que ficava em Ramat Hasharon. Só começou a fazer filmes após seu pai morrer, quando Avi Mograbi tinha 33 anos.

Todos filmes de Mograbi até aqui lidaram com temas políticos, começando com seu primeiro curta, “Deportation” e seu primeiro filme bem conhecido, “How I Learned to Overcome My Fear and Love Arik Sharon”. Foram seguidos por “Happy Birthday, Mr. Mograbi”, “Avenge But One of My Two Eyes”, “August: A Moment Before the Eruption”, “Z32” e seu último filme, “The First 54 Years.” Mograbi costumava pensar que filmes poder mudar a realidade, diz ele. Ele não mais acredita nisso, mas ainda faz filmes sobre situações que parecem causas perdidas, como a Ocupação.

“Eu achava que se as pessoas soubessem o que estava acontecendo, iriam se envolver e a realidade mudaria. E a cada filme eu ficava frustrado por meus filmes não saltarem das páginas de cultura para o discurso social e político. Fora, no exterior, eu tive uma carreira incrível e sou admirado como diretor. Lá, às vezes meus filmes também conseguem transcender das páginas de cultura. Mas não aqui…”

“Nenhum filme meu penetrou tanto, nem mesmo o ‘Avenge But One of My Two Eyes’, que eu achava que iria provocar raiva contra mim, porque no final do filme eu gritava com soldados e não falava educadamente com eles. Após aquele filme, eu realmente experienciei um momento de desânimo. Até me perguntei se deveria continuar fazendo filmes…”

Election rally by the Mograbi Cinema in Tel Aviv, 1955

Cinema Mograbi, Tel Aviv, 1955.

Augusto Boal

Seu mais recente filme anterior, “Between Fences“, que fizemos em conjunto com o diretor teatral Chen Alon e que nenhum canal de TV quis transmitir, era um documentário sobre um workshop de teatro para solicitantes de asilo eritreus e sudaneses no centro de detenção de Holot, baseado no “Teatro do Oprimido”, método desenvolvido pelo artista brasileiro Augusto Boal durante a ditadura militar no Brasil nos anos ‘1960.

“O método afirma que esta é uma produção de teatro por membros de um grupo marginal que escreve uma paça baseada em suas próprias experiências e a apresenta para uma audiência, com cada performance composta de duas partes. A primeira é a própria peça, e na segunda parte eles trazem voluntários da audiência, que fazem o papel do personagem que está sofrendo, atuam em uma das cenas da peça e sugere uma solução alternativa para o dilema que foi apresentado”, explicou Mograbi .

“Boal dizia que este tipo de teatro é essencialmente uma preparação para uma revolução, não no sentido de aprender a fazer coquetéis Molotov e armas, mas como tentativa de engajar a audiência, estimular sua ação, seu ativismo. Com o cinema, não é possível fazer isso, mas vejo os meus filmes como um tipo de combustível, como um tipo de apoio ou serviço aos bons esquerdistas que não estão contentes com a realidade em que vivem”.

Avi Mograbi. 'In my situation and with my standing in the world, I could move wherever I want.'

‘Eu achava que, se as pessoas apenas soubessem o que estava acontecendo, iriam reagir’

Mograbi é bem consciente de que seus filmes não persuadirão os não persuadidos.

“As pessoas que vêm assistir meus filmes nunca são da oposição. Um diretista não vai ver filmes de esquerda, nem precisa disso para discutir com a esquerda. A audiência que vem ver o filme é o coro, aqueles que já foram convertidos”, ressalta. “A esquerda está encolhendo em todo mundo. Não é nada particular a Israel. Então não tenho mais idéias ingênuas sobre mudar a realidade”, diz, antes de rapidamente acrescentar. “de fato eu tenho, mas só nos meus sonhos. Com todos filmes, eu começo pensando que desta vez os espectadores vão adorar, que não tem outro jeito e não é possível que eles não farão nada com o que verão aqui”.

Então, a cada vez, você entra num processo de auto-ilusão

“Não consigo evitar. A realidade que vejo me dói e me perturba. Não consigo ficar em silêncio, sem me expressar. Não acho que alguém que realmente se preocupa o consiga. Mas sim, toda vez que começo um filme, sinto a mesma coisa: Esta vez vou fazer acontecer… Só para descobrir que o alcance é muito mais limitado”.

Por que você acha que seus filmes são melhor recebidos no exterior?

“É mais fácil para gente de fora, porque não é sobre eles. Acabo de vir da França para exibições do filme ‘The First 54 Years’, e há bons esquerdistas lá e perguntam: ‘Como pode o povo judeu, com tudo o que passaram, fazer tais coisas?’, que é uma questão lógica. Como quando gente pergunta como pais cujos pais abusaram deles quando eram crianças podem se tornar eles próprios pais abusivos. E eu respondo: “Como, após a Ocupação alemã na França você foi e fez o que fez na Indochina e Argélia?’ Olhar para dentro é muito mais difícil do que olhar para fora”.

O melhor público de Mograbi e na França, diz. “Quando da estréia de ‘How I Learned to Overcome My Fear and Love Arik Sharon’ no festival de filme documentário de Lussas em1997, por 3 dias após a projeção, sempre que eu caminhava pela única rua do vilarejo, alguém me sorria. Eles rolavam de rir no filme. O amaram absolutamente. Uma das coisas impressionantes daquele festival é quanta gente jovem vem, mesmo que seja naquele pequeno lugar no meio do nada. O público continua sendo jovem”.

“A França é realmente o último superpoder cinemático. As pessoas são ensinadas a amar filmes desde bebês, e o governo também apóia cinemas que mostram filmes experimentais e documentários, que de outra maneira nunca sobreviveriam”.

Talvez também seja mais fácil para nós assistir fílmes críticos sobre outros lugares

“Tenho um problema com filmes que falam do sofrimento de outros, filmes sobre famintos no Terceiro Mundo. Este voyeurismo necrofílico é muito perturbador. Espero não cair em tal necrofilia’.

Apesar da calorosa recepção que recebe no exterior, Mograbi nunca considerou viver em qualquer lugar fora de Israel.

“Na minha situação e com minha posição no mundo, eu poderia mudar para onde quisesse”, diz. “Mas não tenho tais planos ou desejos. Estou ligado a esta cidade. Eu cresci em Tel Aviv, e a conheço por dentro e por fora. Sob o terreno sujo na esquina da Allenby com a Ben-Yehuda é onde todos meus sonhos estão enterrados. Para onde eu iria?

Cada país diferente em que penso tem seu próprio passado sujo. França, Holanda, Bélgica, América. E que tipo de filmes eu faria fora de Israel? Aqui eu conheço as coisas boas e as coisas más. Eu vivo totalmente a história, a política e a cultura deste luga, e eu o amo”.

Mas não existem momentos em que você se sente ameaçado ou como um pária?

“Não, nada disso. Nunca sofre ataques pessoais. Sofri algo pior – ser ignorado. Na comunidade do cinema e na minúscula e sempre encolhendo comunidade esquerdista, recebo meu reconhecimento, mas quando você faz um filme qie é mostrado na TV, espera uma reaçao de algo mais que algumas centenas ou milhares que você já conhece pelo nome. Ser ignorado pode ser algo muito depressivo quando seu campo é a mídia de massa”.

Rompendo o silêncio

Mograbi tem uma conexão muito próxima com o Breaking the Silence. Ele está na diretoria da organização e foi um dos seus fundadores. “Quando nós a fundamos, eu não tinha idéia de quão fantástica a organização se tornaria. Nem imaginávamos a amplitude do alcance que teríamos”.

Mograbi já tinha feito um filme, “Z32,” no qual usou o testemunho dado por um soldado ao Breaking the Silence, mas para sei novo filme, juntou um grande número de testemunhos de períodos diversos, de uma forma que nunca tinhas sido feito antes.

Entre Cercas = Between Fences: uma experiência com o ‘Teatro do Oprimido’ de Gustavo Boal

O aspecto mais singular vem dos testemunhos de pessoas mais velhas, algumas bem conhecodas, como Shlomo Gazit, antigo chefe da Inteligência Militar e Coordenador da Atividade do Governo nos Territórios, que morreu no ano passado; o veterano ativista de direitos humanos Yishai Menuhin; o video-artista Guy Ben-Ner; e o músico Ram Orion.

“Originalmente, Breaking the Silence coletava testemunhos a partir do ano 2000, porque esta era sua geração. Mas quando o 50° aniversário da Ocupação se aproximava, decidimos fazer um projeto que preencheria os lapsos dos primeiros anos, de 1967 a 2000. Após Shay Fogelman, que supervisionava o projeto, e a equipe que trabalhava com ele terminarem de coletar os testemunhos, eu peguei as centenas de horas de material e procurei colocar em alguma forma para decidirmos o que fazer com aquilo. Então eu percebi que poderia usá-lo para fazer um filme que descreveria a Ocupação desde seu primeiro dia até agora”.

Neste filme, há muita gente que nunca tinha falado sobre seu encontro como parte do exército com uma população ocupada.

“Eu não escolhi quem entrevista. Não filmei ou dirigi as entrevistas.É essencialmente um filme baseado em material de arquivo, além dos segmentos em que eu apareço. Uma das coisas mais fortes sobre ter este leque de gerações é a coisa de pais e filhos.

De Shlomo Gazit, que ía à escola com o meu pai, às testemunhas mais jovens, que agora têm 30 anos. Você ouve coisas como ‘mapear as casas” [inspeção de moradias a qualquer hora] e irromper em casas à noite, e você diz: ‘isto é horrível’e então descobre que isto acontece ali o tempo todo. Não é uma prática inventada depois dessa ou daquela intifada. Isto sempre foi feito ali”.

Outra decisão chave na realização do filme foi não incluir as opiniões pessoais dos entrevistados, mas focalizar apenas nas ações.

“Todos os entrevistados eram pessoas cujo serviço militar lhes causou passar por umtipo de transformação. A maior parte dels começou de uma posição política diferente da que tem hoje, incluindo Gazit, que estava ali desde o próprio início da Ocupação. Mas eu decidi não entrar no aspecto psicológico. Focalizei apenas a prática real, os procedimentos, as ordens, as ações. Porque o palestrante não diz “Pense”. Ele diz “Faça”.

“Ao me limitar às ações, eu sem quere dei à luz ao [personagem] do palestrante, e depois senti necessidade de interpretá-lo, pois se o filme se compusesse apenas de testemunhos, ninguém aguentaria. Eu mostrei uma versão assim para os meus dois filhos, que são bons esquerdistas, gente que pensa criticamente, e mesmo eles grosseiramente limparam suas gargantas quando terminou”.

Mograbi não planejou originariamente interpretar o especialista em Ocupação, mas não foi capaz de encontrar outra pessoa que concordaria em fazê-lo.

“A coia mais impressionante foi que todos rejeitavam, de pronto, a possibilidade de que havia um plano, que havia um processo importante por trás dessa coisa [a Ocupação]. Algumas das pessoas com quem falei são pesquisadores militares. E, em certo ponto, percebi que havia jeito de encontrar alguém de dentro, de dentro do sistema, que fosse falar abertamente sobre o grande plano mestre. Então, me voluntariei,

Mas você ´poderia facilmente dizer que Avi Mograbi acharia um jeito, em qualquer evento para enfiar seu nariz dentro do filme, porque em quase todos os meus filme, eu dou um jeito de me inserir”.

Tenho de admitir que é um pouco confuso. Falando contigo, é difícil separar os papéis do filme da pessoa real. Não é sempre claro se a conversa é séria ou sarcástica.

“Em todos filmes, eu apareço como eu mesmo, mas em muitos deles, este eu é muito distante do que realmente sou. Contribuo com o meu belo corpo para a obra de arte e basicamente uso esta possibilidade para olhar o espectador no olho, se posso colocar dessa maneira, e falar diretamente com ele”, brincou.

“Isso começou quando fiz o filme sobre Arik Sharon”, disse referindo-se ao falecido primeiro-ministro Ariel Sharon.

“Eu tinha que ter um papel – não no filme, mas na filmagem, porque eu fui um dos fundadores do movimento Yesh Gvul [Há Limites], criado para apoiar refuseniks que recusavam o serviço militar. Eu sabia que se Sharon desccobrisse isto, ele jamais de deixaria chegar perto dele. Durante a filmagem, e atuei como este diretor incógnito. Há algumas conversas ridículas ali. Nunca sobre política, apenas sobre ovelhas e bezerros. Essas conversas estúpidas se tornaram o coração do filme. Elas geraram o enredo do filme, como se fosse um filme sobre um diretor e o que acontece a ele quando faz um filme sobre Sharon,

“Todo filme desde então teve suas próprias razões para me incluir. Mesmo se eu fizesse um filme sobre moléculas, eu acharia um jeito de entrar nele, para nadar entre as moléculas”.

[ publicado no Haaretz por Shany Littman | 04|10|2021 | traduzida por Moisés Storch para o PAZ AGORA|BR ]

Ficha técnica

Roteiro, som e montagem: Avi Mograbi

Fotografia: Philippe Bellaiche,Tulik Gallon

Montagem: David Charap, Marc Isaacs

Sound design: Joonas Jyrälä, Dominique Vieillard
Mixagem: Dominique Vieillard

Produção Executiva: Camille Laemlé, Serge Lalou

Coprodução: Annie Ohayon-Deckel, Farid Rezkallah, Fabrice Puchault, Anne Grolleron , Elina Pohjola, Leila Lyytikäinen, Heino Deckert, Avi Mograbi

Empresa produtora: Les Films d’Ici

[ Entrevista ao DC FILMFEST de Washington ]

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Official Selection 2021 • Berlin International Film Festival • New York Film Festival • Yamagata International Documentary Film Festival • Visions du Reel Film Festival

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Documentary Films | Avi Mograbi’s official website

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